12 de abril de 2011

III - GIZ

"O que as paredes pichadas têm prá me dizer?
O que os muros sociais têm prá me contar?
Por que aprendemos tão cedo a rezar?
Por que tantas seitas têm aqui seu lugar?"
O Rappa - Brixton, Bronx ou Baixada

Ela andou pelas ruas sem saber bem aonde ir. Desacelerou. O sol estava forte e o calor destorcia a imagem ao bater no asfalto. A cidade, de repente, passou a se movimentar lentamente. As luzes de freios, os automóveis, os sons. A percepção direcionou-se para os detalhes dos muros grafitados, das mensagens subliminares, da indignação discreta. Tentou ler, não conseguiu. Interpretou. Enxergou pedidos singelos de ajuda, de desespero, de socorro. Reivindicações. Tudo aquilo que de dentro de seu conforto e bolha de cristal nunca parara para notar. Tudo aquilo que os ternos finos e elegantes fingem não ver. Tudo aquilo que as pessoas evitam refletir ou mesmo ignoram por trás de seus óculos escuros.. Atravessou a rua, mudando de calçada. Desviando de um ser, que a assustou. Por que o medo? Um estereótipo ou um fato? Aquilo não poderia ser considerado um ser humano. Em qual esquina encontrava-se a dignidade e sanidade de todas aquelas pessoas? Talvez em uma reunião de alta classe juntamente ao poder e dinheiro de nossa admirada High Society. Lembrou-se daquele poema: "O Bicho, de Manuel Bandeira". Enquanto quando criança usava giz para desenhar dias ensolarados na porta de casa, eles tinha um outro giz para escapar da realidade. Sentiu vergonha de si mesma. Sentiu vergonha de reclamar, mesmo que por um instante, e das queixas devido ao metrô lotado na Estação da Sé; das reclamações por suas aulas começarem às 7h10 da manhã; e de ter que estudar para o famoso vestibular. Deu valor a cada pessoa que estava em sua vida. Deu valor as coisas que possui. Deu valor a vida. Notou também como a fé pode ser a única esperança para que as pessoas possam continuar. Rostos cansados e exaustos, contudo, escapulários em volta de pescoços. Olhos fechados com tensão, ou mesmo desilusão. Preces curtas, cada qual a sua maneira. Fé. Algo que não era seu forte, mas admirava nos outros. Intrigava-a como sentimentos abstratos reconfortavam alguns, e eram utilizados como porto-seguro. Talvez a fé seja o único modo de continuarem.. Talvez por isso aprendemos tão cedo a rezar.

Giovanna Malavolta



Nenhum comentário:

Postar um comentário